A União Europeia iniciará em 2027 uma nova fase de seu Sistema de Comércio de Emissões, batizada de ETS2, que passará a precificar o carbono emitido pelo transporte rodoviário e pelo aquecimento de prédios. A medida transforma a emissão de CO₂ em um custo operacional direto para toda a cadeia econômica do bloco.
Como o mecanismo funcionará
Pelo modelo definido, distribuidores de combustíveis terão de comprar licenças de carbono e repassarão esses valores aos clientes. Analistas projetam que o preço do crédito deve ficar entre 45 e 50 euros por tonelada de CO₂, acréscimo que pode elevar o litro do combustível entre 0,10 e 0,15 euro e encarecer o aquecimento de edifícios de 20 a 25 por cento.
Para mitigar o impacto social, o bloco reservou cerca de 86 bilhões de euros no Fundo Social para o Clima, direcionado a famílias de baixa renda. Mesmo assim, a expectativa é de aumento generalizado nos custos de energia e transporte para empresas e consumidores.
Repercussões para consumidores
- Combustíveis: alta imediata no preço final nas bombas.
- Aquecimento: contas residenciais e comerciais mais caras.
- Bens e serviços: repasse de custos logísticos deve pressionar preços ao consumidor.
- Volatilidade: flutuações no valor do crédito de carbono tendem a tornar o planejamento energético mais incerto.
Efeitos sobre transporte e logística
Empresas de carga rodoviária, mais dependentes de diesel, serão as mais afetadas. Estimativas indicam elevação entre 3 e 8 por cento no custo total do frete, variando conforme eficiência da frota, rotas e matriz energética de cada país. Operadores já estudam:
- eletrificação ou hibridização de veículos;
- transferência de volumes para ferrovias e hidrovias;
- uso de telemetria e análise de dados para reduzir quilometragem e tempo ocioso.
Com o carbono negociado em mercado aberto, contratos de transporte deverão incluir um prêmio pela volatilidade dos créditos. Além disso, diretores financeiros precisarão incluir modelos de custo-carbono em seus sistemas, ao lado das previsões tradicionais de combustível.
Impacto na indústria
Setores intensivos em energia — como aço, cimento, químicos e automotivo — enfrentarão nova pressão de custos ao acrescentar a tarifa de carbono sobre combustíveis e aquecimento. Sem ganhos de eficiência ou fontes mais limpas, algumas plantas podem reduzir produção ou migrar para regiões de menor custo.
Parte das empresas, porém, vê na regulamentação incentivo para investir em hidrogênio, eletrificação de calor e energia renovável. A tendência é de concentração industrial onde a eletricidade de baixo carbono for mais barata: a Europa Central deve se manter forte em componentes automotivos, a Península Ibérica pode ganhar espaço graças à energia solar competitiva, e países nórdicos têm condições de expandir a oferta de metais de baixa emissão.
Relocalização e concorrência global
A busca por menores custos pode levar indústrias básicas a considerar deslocamento para Índia, China ou Sudeste Asiático, onde energia é mais acessível e a regulação ambiental, menos rígida. O movimento, contudo, tende a ser limitado por:
Imagem: logisticsviewpoints.com
- tarifas do Mecanismo de Ajuste de Carbono na Fronteira (CBAM) sobre importações intensivas em CO₂;
- estratégias pós-pandemia que priorizam cadeias de suprimento resilientes e próximas dos mercados finais;
- automação e investimento em renováveis, que reduzem a relevância de mão de obra barata e combustíveis fósseis.
Papel do passaporte digital de produtos
Paralelamente ao ETS2, a UE prepara o Digital Product Passport (DPP), sistema que armazenará dados verificados sobre materiais, origem, consumo energético, reparabilidade e pegada de carbono de cada item. A ferramenta deverá:
- melhorar a precisão dos relatórios de emissões de Escopo 3;
- facilitar o cumprimento do CBAM;
- apoiar análises de circularidade, como reúso de peças e reciclagem.
Benefícios, custos e riscos
Ao inserir preço nas emissões, o ETS2 cria responsabilidade mensurável e promove investimentos em tecnologias de baixo carbono. Por outro lado, eleva despesas operacionais em transporte, armazenagem e manufatura, com maior pressão sobre margens de empresas dependentes de combustíveis fósseis. Pequenos operadores podem sentir dificuldades financeiras e administrativas com as novas exigências de reporte.
A oscilação no mercado de créditos complicará orçamentos, enquanto a infraestrutura para frotas elétricas e geração renovável levará tempo para ganhar escala, causando um período de ajuste desigual entre setores e regiões.
Próximos passos para as empresas
Com o carbono passando a ser um insumo financeiro padrão, organizações precisarão integrar dados de emissões a ferramentas de compras, gestão de transporte e finanças. Uso de analytics avançado, torres de controle baseadas em IA e integração com DPP deverão permitir modelagem em tempo real da exposição ao carbono.
Na prática, o indicador-chave tende a migrar para a produção ou entrega por quilograma de CO₂ emitido, refletindo simultaneamente controle de custo e conformidade ambiental.
Com informações de Logistics Viewpoints